Donald Trump e sua família não declararam quase US$ 300 mil (cerca de R$ 1,5 milhão) em presentes que receberam de governos estrangeiros entre 2017 e 2020, incluindo uma “pintura maior que o tamanho real” do ex-presidente que pode estar atualmente em sua residência em Mar-a-Lago, de acordo com um relatório de membros do Partido Democrata no Comitê de Supervisão da Câmara e de documentos de apoio obtidos pela CNN.
Mais de cem presentes de autoridades estrangeiras, incluindo o presidente chinês Xi Jinping e o príncipe herdeiro saudita, Mohammad bin Salman, totalizando mais de US$ 250 mil, nunca foram relatados ao Departamento de Estado pelos Trump.
Os democratas da Câmara dizem que a descoberta desses presentes estrangeiros não declarados — incluindo 17 da Arábia Saudita com um valor total de mais de US$ 48 mil — “levantam questões importantes sobre por que o ex-presidente Trump não os divulgou ao público” e se eles poderiam ter sido usados para influenciar a política dos EUA sob a administração anterior. O relatório não fornece nenhuma evidência específica de que a política norte-americana tenha sido influenciada pelos produtos recebidos.
Jamie Raskin, deputado de Maryland e principal democrata no Comitê de Supervisão da Câmara, disse à CNN que o fato desses itens nunca terem sido relatados e de alguns deles estarem desaparecidos “sugere graves violações da cláusula de pagamentos estrangeiros”.
“Essa parte da Constituição é a lei antissuborno original dos Estados Unidos”, expôs Raskin, observando que os parlamentares podem abrir processos criminais se houver evidências para justificá-lo.
“Mas, na verdade, em uma base bipartidária, o Congresso precisa legislar para criar mecanismos de aplicação significativos na Cláusula de Emolumentos”, acrescentou. “Isso nos forçará a recuperar a sabedoria dos arquitetos que foram enfáticos em que as pessoas que ocupam cargos públicos não estão expostas a governos estrangeiros”.
Os congressistas tentaram dar foco para os compromissos estrangeiros de Trump, já que seus colegas republicanos e o novo presidente do Comitê de Supervisão, deputado James Comer, de Kentucky, estão intensificando sua própria investigação sobre as negociações estrangeiras do presidente Joe Biden, Hunter Biden.
No ano passado, o Departamento de Estado divulgou que não poderia contabilizar totalmente os presentes estrangeiros recebidos por funcionários de Trump durante o último ano do mandato do presidente, mas o relatório provisório divulgado na sexta-feira (17) cita “novas informações obtidas pela comissão [que] revelam que a não divulgação foi muito mais ampla do que se sabia anteriormente e se estendeu por toda a administração Trump”.
“Registros internos obtidos pela Comissão indicam que as listas fornecidas pela Casa Branca ao Gabinete do Chefe de Protocolo não incluíam todos os presentes estrangeiros recebidos pelo ex-presidente Trump e por sua família não apenas em 2020, mas ao longo de todo o administração Trump”, continua o relatório.
“No total, os registros indicam que o ex-presidente Trump e sua família receberam 117 presentes estrangeiros não declarados, avaliados em aproximadamente US$ 291 mil”, mostra o documento. O relatório se concentra em presentes não revelados da Arábia Saudita, Japão, Índia e China.
“No sentido legal, é claro, não faz diferença se eles foram completamente imprudentes ou deliberadamente decidiram desrespeitar a lei e a Constituição, mas, moralmente, podemos dizer com segurança que este é precisamente o tipo de minúcia mesquinha que Donald Trump adora obcecar”, alegou Raskin à CNN.
Individualmente, Trump não relatou mais de 50 presentes estrangeiros, com um valor total estimado em mais de US$ 150 mil, durante seu mandato, segundo os democratas da Câmara. Quanto às doações estrangeiras que compartilhou com o Departamento de Estado, Trump divulgou 36 em 2017, 17 em 2018, 23 em 2019 e zero em 2020.
A Lei de Presentes e Condecorações Estrangeiras proíbe um presidente e autoridades federais de aceitar presentes estrangeiros que excedam o valor mínimo, atualmente estabelecido em US$ 415. A lei também estabeleceu um sistema de como as informações sobre presentes estrangeiros são divulgadas publicamente e permite que os destinatários de itens avaliados acima do valor declarado em dólares, a opção de comprá-los e mantê-los.
Alguns dos presentes que Trump recebeu foram avaliados em dezenas de milhares de dólares, incluindo um tapete de seda uzbeque de US$ 12 mil e uma adaga de US$ 35 mil do emir do Catar, acrescentou o relatório.
O paradeiro de alguns dos itens é desconhecido, incluindo uma “pintura maior que o tamanho real” de Trump que foi encomendada pelo líder de El Salvador e dada de presente pouco antes da eleição de 2020.
O painel obteve comunicações internas da Casa Branca, incluindo correspondência sobre o envio da pintura da Embaixada dos Estados Unidos em El Salvador para os Estados Unidos, mas descobriu que “não há registros do destino da pintura”.
“A Nara [Arquivos Nacionais e Administração de Documentos] não tinha registros dessa pintura e a GSA [Administração de Serviços Gerais] também não tinha registros da compra desse presente”, cita o relatório.
“No entanto, apesar dos documentos de transição da GSA indicando que o gerente de correspondência do escritório de Donald Trump certificou ‘conformidade total com a disposição final de doações’ em abril de 2021, certos registros sugerem que o retrato pode ter sido transferido para a Flórida como ‘propriedade do ex-presidente’ em julho de 2021”.
Trocas de e-mail que incluem fotos do embaixador dos EUA em El Salvador ao lado do retrato gigantesco de Trump indicam que a equipe estava providenciando para que o Departamento de Estado ajudasse a transferir o presente da residência do embaixador para a Casa Branca.
O genro de Trump, Jared Kushner, enviou o e-mail inicial do embaixador sobre a pintura à equipe da Casa Branca, escrevendo: “Podemos cuidar disso? Muito bem”, ao que um ex-funcionário da Casa Branca de Trump respondeu: “Sim, foi encaminhado para mim e estou encaminhando para a WH! [Casa Branca]”
O relatório lista outro item que os investigadores da comissão não conseguiram rastrear, apesar de revisar os dados da Casa Branca, Nara e GSA, um presente que Kushner recebeu do Egito.
O Escritório de Presentes da Casa Branca sob o governo Trump solicitou aos Arquivos Nacionais que transferissem vários artigos de sua custódia para a Casa Branca, que incluía este presente para Kushner. Mas não há registros que indiquem onde está localizado este presente, uma caixa com padrão de prata com um valor estimado de US$ 450.
Também não há evidências que sugiram que a caixa esteja atualmente na posse de Kushner.
O painel também descobriu que Kushner, sua esposa Ivanka Trump e seus filhos receberam 33 presentes não declarados, totalizando quase US$ 82 mil.
“A comissão identificou mais 13 presentes estrangeiros não declarados endereçados ao ex-presidente Trump e à ex-primeira-dama Melania Trump, totalizando mais de US$ 22 mil em valor estimado”, segundo o relatório.
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